28.5.08

Ent[R]evista: Mellotrons

Por Rafael F.


Após a maré mangue beat baixar e os urubus da indústria/imprensa musical pararem de sobrevoar a "cena" recifense, boas bandas tiraram o pé da lama e subiram de vez no asfalto cinza da cidade. Pouco a pouco, meio longe dos olhos dos urubus, surgia uma safra de bandas que só queriam mostrar que Recife tinha rock e que nem tudo era mangue beat. O Mellotrons, banda que entrevistamos aqui no Lado[R], é um exemplo disso. Sem se preocupar com regionalismo/bairrismo, atolou as guitarras nos drives e mostrou pra muita gente o sangue novo que borbulhava na cidade. Nesse bate-papo, Enío – conhecido entre os amigos como o mago das guitarras, devido sua notável habilidade para criar bons riffs – fala da banda e do seu amor por Natal.


Lembro da primeira vez que escutei o mellotrons. Foi no carro de Henrique da banda The automatics, num fim de noite do festival Mada. Na ocasião, estava também Alexandre Alves, do selo Solaris Discos. De prontidão eu perguntei que som era aquele. Alexandre Alves, com um sorriso de menino, respondeu: "Em breve você vai saber quem são eles". Conta um pouco pra gente essa relação da banda com Natal.
Nossa relação com Natal é a das mais estranhas, porém, a mais divertida. Não lembro exatamente como fomos parar aí pela primeira vez, mas lembro que tocamos com o Mombojó no Parque das Crianças, ou algo assim, minha memória não é uma grande aliada. O show em si foi mediano, mas percebemos que uma grande parte do público gostou. Também não me lembro como, mas recebemos um convite pra tocar em Natal com o The Automatics. Ficamos amigos dos caras e decidimos gravar um EP split juntos.A relação mais estranha é com o público de Natal. O público daí é mil vezes mais caloroso do que o de Recife, nossa cidade natal.

Acredito que após o lançamento do split horizon junto ao The Automatics, esse casamento se consolidou...
Acho que antes. Termos participado juntos em um mesmo EP foi só um ato simbólico de algo que já estava estabelecido desde antes.

Você falou que a recepção do público potiguar é mais calorosa do que na cidade de vocês. Você tem alguma explicação pra isso?
Não, nenhuma! Mesmo que alguém pudesse me explicar, eu não iria querer saber. Acho que essa recepção é a grande magia da coisa. Não quero explicações pra não ter que matar essa magia. Amamos Natal mais do que tudo. Falamos em Natal todas as vezes que nos econtramos. Você realmente não imagina o que sua cidade significa pra gente. Tivemos experiência humanas importantes aí. Não só do âmbito musical, mas, existencial, também. Acho que Natal é pra mim o que Avalon era pros Celtas e Valhalla para os Vikings.

Depois da ótima recepção das primeiras músicas do split horizon, vocês gravaram um novo disco, certo? Um disco muito bem gravado, de uma criatividade harmônica impressionante. Fala um pouco dele pra gente.
Hummm... o disco foi gravado aqui em Recife no estúdio Mister Mouse de Léo D. e William P. Se hoje em dia eu sou orgulhoso pelo disco, isso se deve a uma incrível luta por ele, tanto pra erracadar fundos, quanto o processo de gravação, que foi um tanto traumático. Arrumamos vários equipamentos, gravamos rápido, conseguimos captar como queríamos, experimentamos várias coisas, criei várias guitarras na hora (pra variar), mas quando chegou na mixagem/masterização, foi onde o "bicho pegou". A banda sabia muito bem o que queria, enquanto Léo e Will queriam outra coisa. Nossas referências sonoras foram quase todas descartadas por eles, o que no geral foi um grande problema. No fim da gravação, parecia que tínhamos participados de uma daquelas maratonas de dança, sabe? aquelas maratonas que só o último que fica em pé ganha. Mas hoje em dia eu sou bastante orgulhoso dele. Pra mim, da "cena" independente, ele é o melhor disco, tanto na questão musical quanto de som mesmo. Não tenho pudor algum de falar isso.

Da cena independente do Recife ?
Do Recife, com certeza, do Brasil, um dos melhores (não me vem outro em mente, agora).
Agora, o que eu acho interessante do disco é o processo ao contrário dele. Quando gravamos esse disco, já não éramos mais essa banda. Já estávamos compondo em português, quase não tocávamos mais essas músicas.Gravamos por respeito as músicas, respeito a época que elas foram gravadas, então, queríamos fazer um registro disso. Ele não é um disco pra se trabalhar, é uma memória de vida. Ele tem que ser encarado e escutado como um diário. O romance está sendo escrito agora.

Tenho curiosidade sobre essas novas composições em português. Ouvimos algumas delas no último show de vocês aqui em Natal. A banda transitou do inglês para o português? Vocês estão preparando disco novo?
Essa questão de disco novo é algo em que pensamos e não pensamos. Acho que hoje em dia a banda tende mais pro formato EP. Menos músicas, mais fácil de se criar um clima específico, de ser coerente. É, sim, a banda transitou definitivamente do inglês pro português. Não significa que um dia não possamos compor algo em inglês novamente, mas o estado atual da banda é realmente esse.

Alguma previsão pra esse novo material?
Não, nenhuma. Queria que fosse gravado esse ano ainda. Depois do segundo semestre, mas, estamos discutindo sobre isso ainda.

Enio acho que já perturbei demais.... vamos aos finalmentes. O espaço é seu, mande o seu recado...
Para todos aqueles que temem ver sua banda acabando, ou por falta de fé no gosto musical das pessoas, ou pela falta de espaço na mídia. Para todos aqueles que pensam em passar por cima de sua ética pessoal e "se venderem" a algo em que não acreditam e não compactuam, deixo aqui as palavras de Basil King: "Seja corajoso - e forças poderosas virão em seu auxílio". É isso.


[+]: http://www.mellotrons.net




Mellotrons volta a Natal e se apresenta sábado [31/05] ao lado do Bugs e do Automatics.
Veja o cartaz do show: www.fotolog.com/ladoerre .

3 comentários:

B. Sarmento disse...

"Acho que Natal é pra mim o que Avalon era pros Celtas e Valhalla para os Vikings."

uau!

Jucier Morrissey disse...
Este comentário foi removido pelo autor.
Jucier Morrissey disse...

"Pouco a pouco, meio longe dos olhos dos urubus, surgia uma safra de bandas que só queriam mostrar que Recife tinha rock e que nem tudo era mangue beat. O Mellotrons, banda que entrevistamos aqui no Lado[R], é um exemplo disso. Sem se preocupar com regionalismo/bairrismo, atolou as guitarras nos drives e mostrou pra muita gente o sangue novo que borbulhava na cidade."

Que legal!! Um blog, que pelo cometário, parece cultuar APENAS o ROCK e ter preconceito com produções regionais!!